Caros Paroquianos
e Amigos do Vale de Acór
Desta vez da China chegou-nos não a seda, as especiarias ou qualquer outro luxo asiático. Tão pouco os apetecíveis gadgets ou bugigangas baratas vendidas nas lojas de ocasião.
De facto, desta vez, eis que nos sentimos invadidos por uma enorme insegurança no que se refere à nossa saúde, à saúde dos que nos são queridos, à saúde de todos.
Perante tudo isto, e antes demais, e desde logo, uma palavra de imenso respeito e gratidão pelos que cuidam dos outros, nos hospitais deste país!
Os Senhores Bispos de Portugal tomaram a decisão de suspender a celebração das Missas até nova ordem. A mesma medida já tinha sido decidida em Itália e noutros países. Bom, talvez houvesse outras hipóteses... mas, obviamente, confiamos em quem tem a solicitude pelas Igrejas e, assim o esperamos e desejamos que surjam outras modalidades de evitar o contágio que permitam aos cristãos comungarem.
Mas “nada nos separará do amor de Cristo!” Ámen!
No blog da Paróquia foram publicados dois importantes textos sobre a prática da “comunhão espiritual”(https://paroquiamontecaparica.blogspot.com).
Trata-se de uma realidade de fé que ganha agora novo relevo!
Penso que esta é uma hora de penitência. De contricção e de dor no nosso coração. De silêncio e pobreza, sem sermos murmuradores como hoje era referido na primeira leitura a propósito da tentações de Israel no deserto. Sim, tantas as vezes que “comungamos” sem adorarmos e nos unirmos à caridade de Cristo! Sem desejarmos Jesus, sem procurarmos instaurar todas as coisas em Cristo, sem nos unirmos em comunhão com a Igreja, Corpo de Cristo, Templo do Espírito Santo, Povo de Deus que cruza a história levando em vasos de barros, tão frágeis quanto a miséria de cada um de nós, a luz da fé. Tantas Missas à pressa, tantas desconsiderações ao Santo Sacrifício. Missa giras, muito giras, tão giras que mais parecia uma brincadeira donde desapareceu qualquer reverência à santidade do Sacramento. Períodos da vida em que trocamos as lentilhas de uma vida aburguesada com diversões várias, fins de semana aqui e ali, idas à praia, urgências outras — eu sei lá! — de modo que ficou para trás a Herança que Jesus nos deixou no Calvário, o Memorial da Cruz e Ressurreição do Senhor!
Creio, sim, que este é um tempo para vivermos em fraternidade essa dor chamada compaixão! Gente nossa, da nossa família, que falta à Missa, que não vai à Missa, que deixou de ir à Missa. Gente que não recebeu de nós o testemunho da invejável fé que desperta o desejo de ir ao encontro de Jesus e dos irmãos na Santa Missa... Gente cheia de auto-estima pela sua ética de modo que já não se confessa, gente ética que já não reza, gente que já não precisa de Deus porque sabe fazer raciocínios sistemáticos onde já não cabe a realidade mas a amputação da mesma, especialistas em contas complicadas, e inventores de tecnologias que em tudo esquecem Deus. Esse Deus que já não existe nas vidas daqueles que também não hesitam em decidir que as vidas de outros também não devem existir — do aborto à eutanásia. Gente numerosa, essa que sabe melhor do que a natureza o que é o bem e o mal.
Ora, seja por isso bendita esta hora de jejum se assim nos voltarmos com desejo e fé renovada para a Santa Face de Cristo. Que Ele nos faça voltarmo-nos uns para os outros como gente que cuida e que não deixa ninguém para trás.
Todavia, este também não é um tempo para heroicidades desobedientes, tornadas rebeldias. Não percebo que se possa querer muito, tanto, a “Comunhão Sacramental”, esquecendo ao mesmo tempo a comunhão da confiança e da caridade, da humildade e do perdão chamada obediência! Nada de confusões, de relativismos! Ser católico é dar relevo a tudo: à Cerimónia celebrada com cerimónia mas também à parcimónia das opiniões-acusações. As intransigências servem muitas vezes de selfie: de sala de espelhos onde a pose do eu — Narciso nunca rima com santo — exorbita em rigor, antes demais na acusação dos Pastores... Com efeito, não esquecer que o silencio é um dos mais belos sinais da humildade de coração!
De facto, parece-me que ser católico não é estar no meio, num lugar neutro, sem manifestar opiniões e assumir ideias e ideais! Se é certo que o ditado diz que no meio (muitas vezes) está a virtude, muitas vezes, também por lá se esconde o negócio e a negociação de alguma traiçãozita...
Ora ser católico é, isso sim, ter Jesus no meio e nos centro da nossa vida. No meio do coração, dos pensamentos, dos critérios das decisões, das palavras. No centro de onde nascem as nossas escolhas quotidianas ou extraordinárias. Que assim seja! Que Ele esteja no meio de nós. Que nada deste mundo e neste tempo “nos separe do amor de Cristo!” Ámen!
É que ser católico é não esquecer que Deus nos alimenta em três “lugares: [1º] na Sua Palavra (“Quando apareciam as vossas palavras, eu tomava-as como alimento...” Jer 15.16), obviamente de um modo insigne e único [2º] no Pão da Vida (Eu sou o Pão da Vida! Jo 6.48; Tomai e comei. Mt 26.26). Mas não esqueçamos de modo algum a palavra do Evangelho deste Domingo: [3º] “O Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou!” (Jo 4.34). Portanto, se assim os Pastores nos mandaram — agora sem Missa! — assim católicos obedecemos!
Bom, uma palavra mais apontada ao Evangelho deste III Domingo da Quaresma fazendo a ponte para este grande jejum eucarístico com que fomos confrontados! Trata-se de um dos sofrimentos grandes destes dias de pandemia mas que pelo poder de Deus e pela humildade que Ele fará surgir nos nossos corações será uma das graças destes dias! É que, como sempre ocorre nas nossas vidas, quando as desgraças nos espreitarem, e nos rasteiram, o Senhor faz nelas florir grandes graças...
Lembro que este encontro de Jesus com a Samaritana se inclui no percurso em torno do tema muito importante da sede no Evangelho de S. João.
Há sede nas bodas de Caná (Jo 2.1-12),
febre na criança filha do centurião que busca Jesus cheio de sede de ver manifestar-se o seu poder (Jo 4. 43-54),
anuncio de um modo de acreditar que permite nunca mais ter sede (Jo 6.35),
dom de uma água viva para quem tem sede (Jo 7.37)
e a hora maior e misteriosa da Cruz, quando o Senhor exclama com todo o abismo do Seu coração: “Tenho sede” (Jo 19.28).
Em Cristo há, na verdade, dois excessos: a de uma dor que só o amor do Pai, chamado Espírito Santo, pode colmatar.
E um excesso de dom de Si que garante a Igreja! A Igreja que não pode nunca fechar ou esgotar a Caridade de Cristo derramando-se sobre os homens: Deus amou tanto o mundo que lhe deu o Coração de Cristo donde jorra para sempre o sangue que é a Sua vida e a água que é a Sua misericórdia!
Pois bem, à Samaritana que, por acaso (ou Providência), se encontrou com Ele no poço de Jacob, ali chegada desligada, isolada, toda embrulhada na confusão dos seus adultérios e fechada sobre os seus próprios cansaços, Jesus devolveu o conforto “cá de dentro”. Sentado à beira do poço caminhava pela história dela como quem respeita, desafia e liberta. Assim lhe permitiu que encontrasse, também ela, talvez a mais bela vocação de quem se converte, a saber, essa de dar testemunho com comoção de toda uma vida resgatada e agora enviada a anunciar que “Ele está connosco”!
“Ele disse-me tudo o que eu fiz”, disse espantada a Samaritana por haver coincidência entre aquele conhecimento que Cristo tinha do seu coração e a liberdade de poder estar presente na Cidade em nome desse amor, firmeza e coragem na certeza de que “Deus está connosco”!
P. Pedro Quintela
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